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Eleições do Iraque: contagem avança, Sadr lidera voto popular

Dirigente do PCI, Raed Fahmi, representa o Comitê Central em encontro com Muqtada al-Sadr (direita).

A contagem das eleições iraquianas até então informam até então a seguinte distribuição de votos, que não necessariamente se refletem em maiorias parlamentares devido ao sistema eleitoral.

A contagem até agora é de 10 províncias, a maioria do sul. Informações da comissão eleitoral iraquiana foram divulgadas nesse estado pelo jornalista Abdulla Hawez em sua conta do Twitter (@abdullahawez).

Sadr: 1 milhão e 10 mil votos

Muqtada al-Sadr líder popular xiita, descendente de dois Gran Ayatollahs, liderou milícia que se insurgiu contra ocupação dos Estados Unidos no Sul do país e enviou tropas para auxiliar a insurgência em Fallujah (composta por sunitas). Ele está a frente de uma rede de apoio social que atua em bairros pobres herdada de seus familiares.

Sadr voltou a visão pública em 2014 a frente de protestos anti-corrupção.

A coalizão eleitoral se chama “Aliança dos Revolucionários pela Reforma”  e tem como componentes principais o Movimento Sadrista e o Partido Comunista Iraquiano.

Se converteu em um líder de uma coalizão nacionalista, secular e anti-sectária incluindo comunistas e forças liberais. A campanha foca na oposição ao que seria a um sistema corrupto e a forças estrangeiras, incluindo aí não só denúncias contra os Estados Unidos mas um discurso anti-iraniano marcado (“Fora Irã”). Nos últimos anos e nesta eleição, de certa forma, Sadr se desvinculou do próprio “Movimento Sadrista”.

O movimento está com um forte motivo populista e um caráter imprevisível. Parlamentares sadristas que participaram da corrupção endêmica que assola a política iraquiana foram proibidos de concorrer na lista.

O movimento político de Sadr, o Bloco Al-Ahrar, passou pela mesma transformação e seu líder, Dia al-Asadi, um intelectual urbano educado na Grã Bretanha, enfatiza o anti-sectarismo em seu discurso: “Sadr não acredita que a política seja lugar para disseminar a religião”.

Sadr sempre foi contra a federalização do Iraque em linhas sectárias.

Muntazer al-Zaidi, jornalista iraquiano que jogou o sapato em George W. Bush, concorre na lista de Sadr.

Amiri “Unidades de Mobilização Popular”: 962 mil votos

As Unidades de Mobilização Popular (Hashd al-Shaabi) foram milícias que se dizem responsáveis pelo grosso do combate de infantaria contra os terroristas do assim chamado “Estado Islâmico”. São grupos marcados pela identidade xiita, como o Asa’ib Ahl al-Haq, o Kata’ib Hezbollah e o Kata’ib al-Imam Ali.

As UMP fazem parte de uma coalizão que leva o nome “Aliança Fatah”. Existe uma ênfase especial em um discurso de “transformação da velha política”, garantias para os que lutaram contra o Estado Islâmico e compromisso com a ideia de um Eixo de Resistência (Irã-Iraque-Síria-Líbano-Palestina + insurgência houthi no Iêmem). A ideia de “garantias para os que lutaram” é uma contraposição a ansiedade das instituições militares e oficiais frente a oficialização das milícias, bem como uma resposta a aqueles que sugerem que as milícias querem tomar o poder e a oposição manifesta de conselheiros dos Estados Unidos.

A organização política que lidera a coalizão é a Organização Badr,  liderado por Hadi al-Amiri, ministro parte da coalizão do antigo governo e comandante da UMP, arquiteto por trás da oficialização das milícias de uma guarda nacional.

Essa coalizão é marcada por seus vínculos especiais com o Irã e a Guarda Revolucionária Iraniana, o que é visível em seu líder, na UMP e na história da Organização Badr.

A Organização Badr tem um histórico militar anterior a ocupação militar dos Estados Unidos e depois da derrubada de Saddam Hussein que a marca com o estigma de sectária, apesar de ter se esforçado para o contrário nos últimos anos.

Alega-se uma presença minoritária de sunitas e grupos tribais aderindo a coalizão, geralmente aqueles que combateram o Estado Islâmico ao lado do PMU.

Abadi: 717 mil votos

Haider al-Abadi vem se esforça para se apresentar nessas eleições como o líder ao mesmo tempo da estabilidade e da renovação. Seus concorrentes, por outro lado, o tratam como a face da corrupção e do sistema.

A “Aliança da Vitória” pretende ser uma frente ampla e inclusive contava com Amiri até este anunciar sua ruptura pouco antes da eleição.  Ammar Al-Hakim, clérigo líder do Partido Hikma (“Sabedoria”), também rompeu com esta coalizão depois da atitude de Amiri.

Político hábil, Abadi tem fama de ter “ludibriado” os norte-americanos para conseguir enriquecer (os Estados Unidos apostaram nele para suprimir a insurgência iraquiana, os grupos sunitas; Abadi fortaleceu grupos xiitas no processo e aparentemente se valeu de boa parte do dinheiro). Apesar de ter sido tratado como um renegado por vozes dos Estados Unidos, é um político mais conciliador no campo internacional e que demonstra pretensões de “costurar” o atual sistema político iraquiano.

O líder estava a frente do Iraque no momento da vitória contra o Estado Islâmico. Teve a posse saudada pelo ocidente e seus defensores (incluindo aqui ocidentais) apontaram que ele representa sim uma mudança e um estadismo maduro, porém estaria sendo sabotado por outros políticos e velhos aliados como Nouri al-Maliki (a quem ele sucedeu como primeiro ministro mas segue como vice-presidente).

Abadi lidera o Partido Dawa, que compartilha da origem de partido xiita insurrecional contra o governo de Saddam Hussein ainda antes da Revolução no Irã. Hoje se coloca como um partido de centro que fala em nome de uma “democracia islâmica”, recorrendo ao corpo de ideias do clérigo (Grand Ayatollah) Muhammad Baqir al-Sadr. Historicamente rejeitam a ideia de Khomeini e dos iranianos de “governo do jurista islâmico”. A despeito disso, seu último governo foi caracterizado por uma política de aproximação e conciliação com sunitas (as principais vítimas de deslocamento de guerra) e de buscar remediar as causas por trás das insurreições e do Estado Islâmico.

Atualmente também tomou “medidas duras” contra a corrupção. Tomou uma série de medidas contra privilégios de alto oficiais do exército e do Estado (exclusividades, prioridades, etc), medidas contra o “cabidismo”, o reavivamento de casos anti-corrupção, dentre outras medidas que foram saudadas pelo Grande Ayatollah Al-Sistani, um dos principais líderes religiosos xiitas do Iraque e do mundo, mas que evita tomar certas posições nas questões nacionais. Essa política moralizadora, no entanto, pode facilmente ser interpretada como uma resposta aos movimentos de rua que Sadr iniciou em 2014.

Provavelmente o favorito dos Estados Unidos.

Estava a frente no início das contagens, porém foi ultrapassado por Sadr e depois por Amiri.

Maliki: 590 mil votos

Nouri al-Maliki é, junto com Abadi, uma das principais faces da política iraquiana pós invasão, só que mais poderoso. Sua coalizão se chama “Estado de Direito”, com uma forte ênfase na ideia de segurança e a construção de instituições fortes.

Maliki governou por quase dez anos e é figura notável no que concerne a corrupção no sistema iraquiano (ao que seus defensores responderão que se trata de um estadista construindo um Estado a partir de um estado falido, invadido por militares estrangeiros e assolado por terroristas).  Foi ministro do interior por quatro anos.

Seu governo é caracterizado não só pela operação mestra da “baixa política” mas por ter sofrido o grosso das acusações de sectarismo xiita contra a população sunita do país, teria fechado os olhos para uma “ocupação religiosa” dos serviços de segurança e acabando com a representação de árabes sunitas no serviço público em nome da “des-baathificação” (retirando “aliados de Saddam Hussein” dos cargos).

É acusado de ter negligenciado as milícias sunitas que combateram a Al Qaeda (Primavera Iraquiana) ao passo que apoio as milícias xiitas. No entanto, Maliki foi vacilante em dar reconhecimento para as UMP e usou de seu poder de nomeações para plantar aliados no Exército (notório pela corrupção), mesmo depois de ter saído do cargo de Primeiro Ministro, acusado de sabotar o governo de Abadi.

Tem um histórico de vínculos com os políticos da Zona do Curdistão Autônomo. Se afastou gradualmente da política dos Estados Unidos (que o endossava) e se aproximou do Irã – a vitória dos interesses iranianos sobre os norte-americanos é ilustrada pela evolução de Maliki.

Uma parte de seus apologistas, inclusive publicistas do anti-imperialismo, defendem que Maliki passou a representar o Eixo de Resistência, um representante do Iraque contra o projeto conjunto do “Eixo EUA-RASaudita-Israel” de separação e destruição do eixo, enquanto Abadi agora seria um diversionista representante favorito dos interesses norte-americanos.

É de se notar os Estados Unidos e seus porta-vozes intelectuais e midiáticos só passaram a condenar Maliki como “sectário” muitos anos depois desses ataques sectários terem ocorrido, negando de forma hipócrita o papel da ocupação ianque na imposição do sectarismo ao Iraque.

Maliki e seus militantes defendem um governo de unidade nacional, majoritário, e tentaram compor uma frente eleitoral nesses termos com as diversas forças. O líder alega que não pretende mais ocupar os cargos de direção do Estado.

Hakim: 400 mil votos

A coalização do “Movimento Nacional da Sabedoria” tem como figura principal o clérigo xiita Ammar Al-Hakim. Al-Hakim liderava o Supremo Conselho Islâmico do Iraque e saiu para formar este movimento que, diz ele, tem a intenção de “superar a divisão entre sectários e nacionalistas, abrir para os sunitas, se entender com os países vizinhos e se desassociar de conflitos regionais”.

O Supremo Conselho Islâmico do Iraque era um dos movimentos xiitas mais antigos na oposição contra Saddam e participou ativamente do primeiro governo provisório após a invasão. Forte no sul do país e em especialmente Basra, especialmente pró-iraniano, mas diferente do Dawa e dos Sadristas defendia a federalização total do Iraque e a criação de um estado xiita no sul do país.

Aliança com comunistas:

A aliança do Movimento Sadrista com o Partido Comunista Iraquiano chamou muita atenção. Ambos os movimentos declaram que se trata de um objetivo comum de “vencer a corrupção, reformar o país”.

Em visita ao Iraque, o político iraniano Ali Akbar Velayati declarou que “nós não vamos deixar o Irã ser governado por comunistas e liberais”, o que lhe rendeu muitas críticas.

Na foto, Suhil al-Khatib, comunista eleita em Najaf, a cidade mais sagrada do xiismo. Sua política envolve a militância pelos direitos das mulheres.

Partidos curdos rejeitam resultados

Os partidos de oposição curda (CDJ, Gorran, KIU, KIG, KIM, KCP, NG) fizeram uma declaração conjunta de que houve fraude por parte dos partidos KDP (Partido Democrático Curdo) e PUK (Partido da União Curda)

Até agora, acusações de fraude vem sendo tratadas pela autoridade eleitoral iraquiana como levianas e sem substância. Os partidos de oposição alegam ter evidências de fraude sem precedentes em Erbil, Sulimania e Duhok – pedem novo processo no norte do país.

Segundo as contagens, todas as listas curdas perderam votos. Os partidos KDP e PUK são os que mais perderam, respectivamente. Em outras regiões partidos curdos compuseram as outras listas nacionais mencionadas acima.

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