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Macri e sua dívida inútil

Sob Macri, a Argentina endividou-se mais do que na Ditadura e no período Menem. A maior parte das divisas, no entanto, foi usada para operações financeiras.
por Guillermo Oglietti e Alfredo Serrano Mancilla | Celag – Tradução de Pedro Marin para a Revista Opera
(Foto: Monica Martinez-gv/GCBA.)

Em três períodos diferentes da história moderna a Argentina recorreu ao endividamento de forma insensata. Na ditadura (1976-1983) criou-se uma dívida anual referente a 164 dólares por argentino (considerando valores atuais). Durante a Convertibilidad[1] (Plano Cavallo, 1991) a dívida aumentou em 192 dólares per capita. O Macrismo, nos primeiros três anos no poder, aumentou a dívida na razão de 890 dólares anuais por habitante. A dívida anual por habitante criada com Macri é entre 4,5 e 5,5 vezes maior que a de estes dois períodos que desembocaram na crise da dívida dos anos 80 e na crise de 2001.

O modelo neoliberal comandado pela aliança entre o PRO (Proposta Republicana – partido de Macri) e o radicalismo contraiu nos três primeiros anos uma dívida de 120.532 milhões de dólares, que equivalem a um Plano Marshall em valores atuais. O Plano Marshall serviu para reconstruir a infraestrutura e a capacidade produtiva dos países europeus, e também para fortalecer o Estado de Bem-Estar na Europa depois da guerra. No sentido contrário, o “Plano Marshall” recebido por Macri foi usado para contrair a economia, destruir o tecido industrial e para gerar inflação, desemprego e pobreza.

Definitivamente, a dívida foi inútil e ineficiente. A pergunta de um milhão de dólares é simples: Onde foi parar a enorme dívida contraída nestes três anos e meio de governo? De cada 100 dólares disponíveis, Macri usou 60 para questões financeiras (fuga de capitais, pagamentos de dívida, e remessa de lucros e dividendos), 17 para importações ociosas e apenas 23 para importar bens vinculados à produção.

De acordo com estimativas do CELAG, realizadas com um modelo econométrico clássico de crescimento, se seu governo tivesse empregado as abundantes divisas disponíveis da mesma maneira “promédio” que elas foram utilizadas nas últimas quatro décadas, o PIB de 2018 teria de haver crescido cerca de 8% em relação a 2015, no lugar de cair 2%. Assim, nosso cálculo mostra que a economia argentina desperdiçou cerca de 27% do PIB acumulado, que representa uns 3.9 bilhões de pesos pelo mal manejo das divisas. Essa cifra equivale ao custo de construir até 5.756 hospitais, 32.217 escolas, ou até 31 anos de Alocação Universal por Filho [2]. Em termos de emprego, não só poderíamos não ter o nível de ocupação caindo, como também podíamos ter criado até 130 mil postos de trabalho novos mediante um bom uso das divisas disponíveis.

A dívida é como a lactose: alguns não a digerem. A primeira vez que uma criança fica doente ao tomar leite, ela vai com seu pai ao médico, que diagnostica o problema. Se segue tomando leite e ficando doente, o médico já não diagnostica intolerância à lactose na criança, mas negligência e estupidez no pai. Na terceira vez que isso se repete, o médico o declarará culpável ou sádico. O mecanismo de busca acadêmica do Google mostra mais de 7.000 resultados quando as palavras “dívida”, “intolerância” e “Argentina” são combinadas, a maioria após a crise de 2001. Portanto, não é um problema de ignorância ou diagnóstico errado. Tampouco é estupidez dos argentinos, porque a grande maioria nunca escolheu conscientemente uma opção política que se propunha a endividar o país indiscriminadamente. Então deduza, leitor, do que se trata.

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Notas:

[1] A Convertibilidad (lei de conversibilidade) foi um pacote econômico de estabilização monetária vigente no governo Menem. O plano estabelecia uma taxa de câmbio do austral em relação ao dólar na razão de 1:1, ou seja; dolarizava a economia.

[2] Asignación Universal por Hijo no original. Espécie de Bolsa Família argentino. Trata-se de uma cifra de dinheiro concedida pelo estado a pais de menores em situação econômica vunerável.

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