UOL - O melhor conteúdo
Pesquisar
, ,

A “ameaça” da Venezuela e a hipocrisia paramilitar

Pesassem todos os fatos na balança do TIAR, o que haveria no continente não seria a "defesa mútua" das Nações, senão a guerra mútua, total e continental.

por Pedro Marin | Revista Opera
Militares venezuelanos. (Foto: PrensaFANB)

Na última quarta-feira (11) foi aprovada na OEA (Organização dos Estados Americanos) uma resolução convocando uma reunião entre os países signatários do TIAR (Tratado Interamericano de Assistência Recíproca) no sentido de ativar o pacto contra a Venezuela.

O tratado, que tem como princípio que um ataque contra um dos países-membros será considerado um ataque contra todos, foi oficializado em 1947, entrando em vigor no ano seguinte. Inspirado na chamada Doutrina Monroe, segundo a qual os países da América Latina e Caribe constituíam um grande protetorado norte-americano, o acordo foi formalizado e assegurado durante a Guerra Fria, alongando no tempo a aliança dos EUA com os países do continente, assegurada para impedir a influência do Eixo no hemisfério durante a Segunda Guerra.

Na reunião desta quarta-feira, 12 dos 18 países-membros do TIAR votaram favoravelmente à resolução, que argumenta que a crise na Venezuela “tem um impacto desestabilizador, representando uma clara ameaça à paz e à segurança do hemisfério.”

Proposta pela Costa Rica, foi rechaçada pelo Brasil uma emenda que, apesar de favorável à instalação do TIAR, proibia expressamente medidas “que impliquem no emprego de força armada” e falava em uma “restauração democrática” na Venezuela.

O chanceler Ernesto Araújo, no entanto, disse que a convocação “não significa ação militar, de forma nenhuma, não é isso que nós queremos, o TIAR não é simplesmente um acordo de ação militar; é um acordo para ação coletiva diante de ameaças à segurança, como claramente é. O chanceler da Colômbia, se não me engano, fez uma apresentação muito clara nesse sentido, com o fato de o regime Maduro estar abrigando terroristas”, se referindo às FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).

[button color=”” size=”” type=”” target=”_blank” link=”https://revistaopera.operamundi.uol.com.br/2019/03/01/notas-sobre-a-venezuela-as-coisas-da-guerra-estao-sujeitas-a-continua-mudanca/”]Leia também – Notas sobre a Venezuela: as coisas da guerra estão sujeitas à contínua mudança[/button]

Continua após o anúncio

Só faltou combinar direito com o auto-proclamado Juan Guaidó, que representa a Venezuela na OEA – apesar de não ser presidente de nada, a não ser da alcateia internacional que tenta mudar o governo do país por via golpista. De acordo com o que reporta a Folha de São Paulo, membros da comitiva de Guaidó confirmaram que a resolução pode sim levar a um cenário de intervenção militar contra a Venezuela.

Naturalmente, a argumentação dos chanceleres da Colômbia e Brasil representa nada senão propaganda odienta, que suplica por ouvidos mal-informados. Se a presença de membros ou ex-guerrilheiros das FARC na Venezuela representa uma ameaça continental, o que dizer de organizações criminosas brasileiras que vão ganhando força em território paraguaio? Seria viável aplicar o TIAR contra o Brasil, ou ainda contra o Paraguai, abrigo do Exército do Povo Paraguaio (EPP), que também já agiu para além da fronteira, no Brasil? Que dizer então da paramilitaresca Colômbia, que exporta seus paracos para o território venezuelano? A propósito, o auto-proclamado presidente Juan Guaidó, que como foi revelado recentemente se encontrou com narcotraficantes colombianos, representa também uma ameaça a todo o continente?

Juan Guaidó posa ao lado de Jhon Jairo Durán Contreras (“el Menor”), e Albeiro Lobo Quintero, conhecido como “el Brother”, membros do grupo “Los Rastrojos”. (Reprodução)

E se a alcateia não considerasse como risco à segurança continental o conto sobre perigosos guerrilheiros em território venezuelano, e sim a crise – como diz a resolução -, o caminho da paz e da segurança por excelência não poderia estar na aplicação de mais sanções e bloqueios contra a Venezuela, mas na sua anulação e na coleta de ajuda para o país.

Pesassem todos estes fatos na balança torta que querem fazer alguns países do TIAR, o que haveria no continente não seria a “defesa mútua” das Nações, senão a guerra mútua, total e continental. E, se a busca destes fosse a segurança do continente, sem dúvidas seria contra Bolsonaros, Guaidós, Abdos, Duques e, acima de tudo, Trumps, que o TIAR seria solicitado. Afinal, são estes os sobrenomes – não “Maduro” – de quem tenta colocar o continente numa espiral caótica, em busca de mesquinhos ganhos políticos e econômicos, que não beneficiariam povo nenhum, mas sem dúvidas agradariam a muitos empresários e banqueiros.

[rev_slider alias=”livros”][/rev_slider]

Continue lendo

Em diferentes contextos, líderes de extrema direita promovem um modelo de governança que algema o Estado de suas funções redistributivas, enquanto abre caminho para que o cripto-corporativismo baseado em IA opere livremente – às vezes até promovendo seu uso como política oficial do Estado. (Foto: Santiago Sito ON/OFF / Flickr)
Por que a extrema direita precisa da violência
Entre 1954 e 1975, as forças armadas dos Estados Unidos lançaram 7,5 milhões de toneladas de bombas sobre o Vietnã, o Laos e o Camboja, mais do que as 2 milhões de toneladas de bombas lançadas durante a Segunda Guerra Mundial em todos os campos de batalha. No Vietnã, os EUA lançaram 4,6 milhões de toneladas de bombas, inclusive durante campanhas de bombardeios indiscriminados e violentos, como a Operação Rolling Thunder (1965-1968) e a Operação Linebacker (1972). (Foto: Thuan Pham / Pexels)
O Vietnã comemora 50 anos do fim do período colonial
"Pepe" Mujica, ex-guerrilheiro Tupamaro e ex-presidente do Uruguai, falecido em 13 de maio de 2025. (Foto: Protoplasma K / Flickr)
Morre José Mujica: o descanso do guerreiro

Leia também

São Paulo (SP), 11/09/2024 - 27ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo no Anhembi. (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)
Ser pobre e leitor no Brasil: um manual prático para o livro barato
Brasília (DF), 12/02/2025 - O ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, durante cerimônia que celebra um ano do programa Nova Indústria Brasil e do lançamento da Missão 6: Tecnologias de Interesse para a Soberania e Defesa Nacionais, no Palácio do Planalto. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
O bestiário de José Múcio
O CEO da SpaceX, Elon Musk, durante reunião sobre exploração especial com oficiais da Força Aérea do Canadá, em 2019. (Foto: Defense Visual Information Distribution Service)
Fascista, futurista ou vigarista? As origens de Elon Musk
Três crianças empregadas como coolies em regime de escravidão moderna em Hong Kong, no final dos anos 1880. (Foto: Lai Afong / Wikimedia Commons)
Ratzel e o embrião da geopolítica: a “verdadeira China” e o futuro do mundo
Robert F. Williams recebe uma cópia do Livro Vermelho autografada por Mao Zedong, em 1 de outubro de 1966. (Foto: Meng Zhaorui / People's Literature Publishing House)
Ao centenário de Robert F. Williams, o negro armado
trump
O Brasil no labirinto de Trump
O presidente dos EUA, Donald Trump, com o ex-Conselheiro de Segurança Nacional e Secretário de Estado Henry Kissinger, em maio de 2017. (Foto: White House / Shealah Craighead)
Donald Trump e a inversão da estratégia de Kissinger
pera-5
O fantástico mundo de Jessé Souza: notas sobre uma caricatura do marxismo
Uma mulher rema no lago Erhai, na cidade de Dali, província de Yunnan, China, em novembro de 2004. (Foto: Greg / Flickr)
O lago Erhai: uma história da transformação ecológica da China
palestina_al_aqsa
Guerra e religião: a influência das profecias judaicas e islâmicas no conflito Israel-Palestina